sábado, 5 de fevereiro de 2011

NEUROPATIAS PERIFÉRICAS

É uma síndrome de perda sensorial, atrofia e fraqueza muscular, e decréscimos nos reflexos profundos, sintomas vasomotores, sozinhos ou em combinação. Estes podem ocorrer com a doença em um único nervo (mononeuropatia), 2 ou mais nervos em áreas separadas (mononeuropatia múltipla) ou muitos nervos simultaneamente (polineuropatia). O axônio (diabetes, uremia, agentes tóxicos) ou a bainha de mielina/células de Schwann (leucodistrofias, polineuropatia inflamatória crônica e aguda), podem ser os locais primários de lesão. Podem ser afetados pequenas fibras mielinizadas, causando perda primária da temperatura e sensação de dor ou fibras grandes, causando defeitos proprioceptivos ou motores. Algumas neuropatias (chumbo, dapsona, tiques, porfiria, síndrome de Guillain-Barré) envolvem primariamente fibras motoras, enquanto outras afetam principalmente a raiz dorsal de gânglios ou fibras sensoriais, produzindo sintomas sensoriais (ganglionite de raiz dorsal, devido ao câncer, lepra, AIDS, diabetes e intoxicação crônica por piridoxina). Ocasionalmente, os nervos cranianos também são envolvidos (Guillain-Barré, diabetes melito, difteria). Conhecer as modalidades particularmente envolvidas, auxilia os médicos a determinar a causa, embora algumas neuropatias permaneçam não diagnosticadas. AIDS sempre deve ser considerada em casos precariamente explicados, ocorrendo em áreas epidêmicas.


Etiologia

Trauma é a causa mais comum de lesão localizada em um único nervo. Paralisia devido à pressão usualmente afeta os nervos superficiais (ulnar, radial e peroneal) em proeminências ósseas (p. ex., durante o sono profundo ou anestesia em pessoas caquéticas ou magras e freqüentemente em alcoólatras) ou em canais estreitos (p. ex., em neuropatias compressivas, como a do nervo mediano na síndrome do túnel cárpico). A paralisia devido à pressão pode ser resultante de tumores, hiperosteose óssea, aparelho de gesso, esmagamentos ou posturas prolongadas conduzindo a cãibra (p. ex., em jardinagem).

A atividade muscular violenta ou superextensão forçada de uma articulação pode produzir uma neuropatia focal, como também pequenos traumas repetidos (escultores que seguram pequenas ferramentas mecânicas, ou operador de martelo de ar comprimido, por vibração excessiva). A hemorragia para um nervo e exposição ao frio ou radiação podem causar neuropatias.

Mononeuropatia múltipla usualmente é secundária a distúrbios do colágeno vascular (poliarterite nodosa, LES, esclerodermia, sarcoidose, e AR), doenças metabólicas (diabetes melito), ou doenças infecciosas (doença de Lyme, HIV). Microrganismos podem causar mononeuropatias por invasão direta do nervo (p. ex., lepra).

Polineuropatia com doença febril aguda pode ser devido à toxina (difteria) ou a uma reação auto-imune (síndrome de Guillain-Barré); a polineuropatia que algumas vezes acompanha as imunizações também provavelmente é auto-imune.

Os agentes tóxicos geralmente causam uma polineuropatia, mas algumas vezes uma mononeuropatia. Estes incluem emetina, hexobarbital, barbital, clorobutanol, sulfonamidas, fenitoínas, nitrofurantoínas, os alcalóides da vinca, metais pesados, CO, triortocresilfosfato, ortodinitrofenol, muitos solventes e outros tóxicos industriais.

A deficiência nutricional e distúrbios metabólicos podem resultar em polineuropatia. A deficiência de vitaminas B freqüentemente é uma causa (p. ex., alcoolismo, beribéri, anemia perniciosa, deficiência de piridoxina induzida por isoniazida, síndromes de malabsorção e hiperemese gravídica). Também ocorrem polineuropatia em hipotireoidismo, porfiria, sarcoidose, amiloidose e uremia. O diabetes melito causa várias formas de neuropatia: polineuropatia distal sensorimotor (mais comum), mononeuropatia múltipla e mononeuropatia focal (p. ex., nervos cranianos oculomotores e abducentes).

Neoplasias malignas podem causar uma polineuropatia secundária a uma gamopatia monoclonal (mieloma múltiplo, linfoma) ou invasão amilóide dos próprios nervos e/ou deficiências nutricionais.

Sintomas, Sinais e Formas Clínicas

Mononeuropatia, única e múltipla, é caracterizada por dor, fraqueza e parestesia na distribuição do nervo afetado. A mononeuropatia múltipla é assimétrica, e todos os nervos afetados podem ser envolvidos desde o início ou progressivamente. O envolvimento extensivo de muitos nervos pode simular uma polineuropatia.

Neuropatias de compressão e estiramento resultam do compromisso mecânico de um nervo. Paralisia de nervo ulnar freqüentemente é causada por trauma para o nervo no sulco ulnar do cotovelo, devido a apoio repetido no cotovelo ou por crescimento ósseo assimétrico após uma fratura na infância ("paralisia ulnar tardia"). A compressão do nervo ulnar também pode ocorrer no túnel cubital. Há parestesias e deficiências sensoriais no 5º e na metade lateral do 4º dedo, mais fraqueza e atrofia do adutor do polegar abdutor do 5º dedo e músculos interósseos. A paralisia ulnar crônica, grave produz uma deformidade do tipo "mãos em garra". Estudos precisos de condução nervosa identificam o local da lesão. Deve ser aplicado o tratamento conservativo porque o reparo cirúrgico nunca é bem-sucedido.

A síndrome do túnel cárpico resulta de compressão do nervo mediano na face volar do punho, entre os tendões longitudinais dos músculos do antebraço que flexionam as mãos e o ligamento cárpico superficial transverso. Essa compressão produz parestesia na face radial-palmar da mão, mais dor no punho, na palma, ou algumas vezes proximal à compressão no antebraço e ombro. A dor pode ser mais intensa à noite. A deficiência sensorial na face palmar dos 3 primeiros dígitos e/ou fraqueza e atrofia nos múltiplos controladores da abdução do polegar seguido de aposição. A síndrome é relativamente comum, pode ser uni- ou bilateral e ocorre mais freqüentemente em mulheres. Está particularmente associada com ocupações que requerem a flexão forçada e repetida do punho, e também com acromegalia, mixedema e alterações fluídicas da gravidez. A principal distinção para ser feita é de compressão de raiz de C-6 devido à radiculopatia cervical.

Tratamento – Deve ser interrompido a execução de tarefas que requeiram a flexão forçada do punho. Virado auxilia a aliviar a dor durante a noite e tira a pressão do nervo por um tempo limitado. Infiltrações locais de corticosteróides, ocasionalmente, trazem um alívio temporário. Se os sintomas continuam ou progridem, a descompressão cirúrgica do nervo mediano no punho é requerida.

Paralisia de nervo peroneal usualmente é causada por compressão do nervo contra a face lateral do pescoço fibular. É mais comum em pacientes confinados ao leito, edemaciados e em pessoas magras que habitualmente cruzam as pernas. Há presença de fraqueza devido à dorsiflexão e eversão do pé (pés caídos). Ocasionalmente, é encontrado uma deficiência sensorial sobre a face ântero-lateral da parte inferior da perna e dorso do pé ou no espaço do tecido entre o 1º e o 2º metatarso.

Paralisia de nervo radial ("paralisia do sábado à noite") é causada pela compressão do nervo contra o úmero – p. ex., o braço permanece pendido sobre as costas de uma cadeira durante intoxicação ou sono profundo. Os sintomas incluem fraqueza do punho e extensores dos dedos (punho caído), e ocasionalmente, perda sensorial sobre a face dorsal do 1º músculo dorsal interósseo.

O local da lesão nervosa pode ser identificado pelo sinal de Tinel, uma parestesia distal na distribuição do nervo que é desencadeada por percussão sobre o local da compressão. Os estudos de condução nervosa e eletromiografia são mais úteis na localização.

A polineuropatia é relativamente simétrica; sensorial, motora e as fibras vasomotoras freqüentemente estão envolvidas simultaneamente. A forma mais comum de polineuropatias, observadas em doenças metabólicas (p. ex., diabetes melito, insuficiência renal, desnutrição), se desenvolve lentamente, freqüentemente após meses ou anos; usualmente inicia-se com anormalidades sensoriais nas extremidades inferiores. As anormalidades usualmente são mais graves na região distal que proximal. Freqüentemente, há proeminência de sensações vibratórias, deficiências na propriocepção, dor em queimação, torpor, e formigamento periférico. Freqüentemente, a dor piora à noite e pode ser agravada pelo tato da área afetada ou por alterações de temperatura. Em casos graves, pode ser demonstrado sinais objetivos de perda sensorial, tipicamente com distribuição em dedos de luva. O tendão de Aquiles e outros reflexos profundos do tendão estão diminuídos ou ausentes. Podem ser observadas úlceras indolores nos dígitos de Charcot quando a perda sensorial é profunda. A deficiência proprioceptiva ou sensorial pode conduzir a anormalidades de marcha. O envolvimento motor resulta em fraqueza de músculos distais e atrofia.

O sistema nervoso autônomo pode ser adicionalmente ou seletivamente envolvido, conduzindo a diarréia noturna, incontinência intestinal e vesical, impotência, ou hipotensão postural. Os sintomas vasomotores são variáveis. A pele pode ser mais pálida e seca que o normal ou pode haver excesso de sudorese e/ou descoloração fusca. As alterações tróficas são comuns em casos prolongados e graves; elas consistem de pele lisa e brilhante, de unhas serrilhadas ou escavadas, e osteoporose.

Não comumente, pode ser observado uma polineuropatia sensorial que inicia com parestesia e dor periférica que apresenta uma progressão central para a perda de todas as formas de sensação. Isso ocorre como um efeito remoto de carcinoma, especialmente broncogênico, após megadose de intoxicação com piridoxina, em amiloidose, hipotireoidismo, mieloma e uremia.

Diagnóstico

A neuropatia é um sintoma mais complexo que a própria doença, e a causa deve ser investigada. Podem ser encontrados indícios de um distúrbio sistêmico no exame físico ou na história. Estes incluem erupção cutânea, úlceras cutâneas, fenômeno de Raynaud, perda de peso, febre, linfadenopatia ou lesões em massa.

Os achados laboratoriais freqüentemente são úteis. O hemograma pode revelar megaloblastos de anemia perniciosa ou hemácias pontilhadas de intoxicação por chumbo. Os testes anormais de função hepática e a fosfatase alcalina pode sugerir uma neoplasia maligna de base. Glicose e creatinina no sangue podem sugerir um diagnóstico de insuficiência renal ou diabetes melito. A urina deve ser checada para porfirinogêneos, porfobilinogêneos e metais pesados.

Proteínas séricas anormais e imunoeletroforese podem dar suporte a um diagnóstico de neuropatia associada a mieloma múltiplo ou gamopatia monoclonal. Crioglobulinas ou fixações de complemento devem ser checadas da forma adequada. A função tireóide deve ser avaliada, incluindo o hormônio tireóide estimulante, em pacientes com síndrome do túnel cárpico.

Eletromiografia (EMG) e testes de velocidade de condução nervosa auxiliam a confirmar a neuropatia e a documentar o envolvimento específico do nervo e o tipo predominante de fibra envolvida (sensorial, motora). Lesões desmielinizantes diminuem as conduções nervosas e o bloqueio desmielinizante focal pode ser documentado. Um processo axonal causa atividade espontânea no EMG juntamente com baixa amplitude de respostas evocadas, e velocidades de condução relativamente preservada nos estudos de condução nervosa. Em síndrome do túnel cárpico, a condução lenta atravessa o ligamento cárpico, prolongando a latência do abdutor pollicis brevis ou bloqueando juntamente. A latência sensorial distal é similarmente mais extensa. As latências distais sensoriais e motoras ulnares devem ser normais no mesmo braço. A biópsia muscular, algumas vezes, pode prover o diagnóstico específico (triquinose, sarcoidose, poliarterite). Raramente, são indicadas biópsias de nervos surais.

Prognóstico e tratamento

O tratamento do distúrbio sistêmico (diabetes, insuficiência renal, mieloma múltiplo ou tumor) pode interromper a progressão e melhorar os sintomas, mas a progressão é lenta. As lesões traumáticas com a transecção completa do nervo requerem aposição cirúrgica. As neuropatias podem requerer injeções de corticosteróides ou descompressão cirúrgica. A fisioterapia e imobilizações podem reduzir a probabilidade ou a gravidade de contraturas.

Síndrome De Guillain-Barré (Polineuropatia Aguda; Polirradiculite Aguda; Polineuropatia Idiopática Aguda ou Infecciosa; Polirradiculoneuropatia Desmielinizante Segmentar Aguda)

É uma forma usualmente rapidamente progressiva, aguda de polineuropatia inflamatória caracterizada por fraqueza muscular e perda sensorial distal leve, que em cerca de dois terços das vezes inicia 5 dias a 3 semanas após um distúrbio infeccioso banal, cirurgia ou imunização. A síndrome de Guillain-Barré (SGB) é a neuropatia desmielinizante adquirida, mais freqüente. A causa é desconhecida, embora uma base auto-imune possa ser provável. Histologicamente, áreas focais de desmielinização segmentar com infiltração endoneural e perivascular de linfócitos e monócitos são dispersadas ao longo de nervos periféricos, raiz e nervos cranianos. Em lesões graves, a degeneração axonal acompanha a desmielinização segmentar.

Sintomas e Sinais

Fraqueza relativamente simétrica acompanhada por parestesia usualmente inicia-se nas pernas e progride para os braços. A fraqueza é sempre mais proeminente que os sinais e sintomas sensoriais, e pode ser mais proeminente em local proximal. Os reflexos profundos do tendão estão perdidos. Usualmente, os esfíncteres são poupados. Mais de 50% dos pacientes gravemente acometidos apresentam fraqueza de músculos orofaríngeo e facial, e 5 a 10% requerem intubação para insuficiência respiratória. A disfunção autônoma, incluindo flutuações de PS, secreção inapropriada de ADH, arritmias cardíacas e alterações pupilares ocorrem em pacientes mais gravemente envolvidos. A paralisia respiratória e os defeitos autônomos podem acarretar risco de vida. Apesar dos avanços no cuidado respiratório, até 5% dos pacientes morrem; 90% dos pacientes alcançam seu grau máximo de fraqueza em 3 semanas, e a maioria entre estes em 2 semanas.

Numa variante não usual de polineuropatia idiopática aguda, os pacientes podem desenvolver apenas oftalmoparesia, ataxia e arreflexia. É importante esses casos descartar miastenia grave, deficiência aguda de tiamina e, raramente, botulismo.

Diagnóstico

O diagnóstico de SGB aguda é baseado na síndrome clínica. As investigações laboratoriais incluem aumento de proteínas sem aumento de células no LCR. As anormalidades eletrofisiológicas sustentam o diagnóstico, mas as últimas são dificilmente necessárias em casos típicos. Dois terços dos pacientes apresentam velocidades de condução nervosa lentas e evidência de desmielinização segmentar no início. As latências de ondas F evidenciam a desmielinização proximal e tendem a ser prolongadas. Mononucleose anterior ou infecções por citomegalovírus, coqueluche ou rubéola podem ser excluídas por testes sorológicos apropriados , mas não alteram o prognóstico.

Diagnóstico diferencial incluem toxinas que atuam na junção neuromuscular (p. ex., fosfatos orgânicos e botulismo. Ocorre poliomielite aguda em epidemias que produzem febre, mal-estar, e pleocitose no LCR. Há estudos sorológicos disponíveis. A infestação de carrapato no couro cabeludo causa uma neuropatia motora ascendente aguda, principalmente em crianças. Os reflexos profundos do tendão estão perdidos e as sensações são normais. A remoção do carrapato resulta em resolução de todos os sintomas.

Prognóstico e Tratamento

A polineuropatia grave aguda é uma emergência médica, requerendo monitoração constante e assistência vigorosa às funções vitais. As vias aéreas devem ser mantidas claras e a capacidade vital deve ser medida freqüentemente, de maneira que se necessário, a respiração possa ser assistida. A ingestão de fluidos deve ser o suficiente para manter um volume urinário de pelo menos 1 a 1,5L/dia; os eletrólitos séricos devem ser monitorados para prevenir intoxicação hídrica. As extremidades devem ser protegidas de trauma e da pressão das roupas de cama. O calor auxilia no alívio da dor e permite uma fisioterapia precoce. A imobilização pode causar anquilose e deve ser evitada. Uma série completa de movimentos articulares passivos deve ser imediatamente iniciada, e os exercícios ativos devem iniciar quando os sintomas agudos apresentarem remissão. Pode ser benéfico a administração de 5.000u, de heparina, s.c. enquanto o paciente estiver confinado ao leito.

Corticosteróides pioram os resultados em SGB e não devem ser utilizados. Plasmaferese tem se revelado benéfico quando conduzido no início da doença, e é o tratamento de escolha em pacientes agudamente doentes com SGB. É um procedimento relativamente seguro que reduz o curso da doença, diminui a mortalidade, diminui a incidência de paralisia permanente, e abrevia a hospitalização.

É usual uma melhora considerável por um período de meses; cerca de 30% dos adultos apresentam fraqueza residual em 3 anos, e a porcentagem é maior em crianças. O defeitos residuais podem requerer treinamentos, aparelhos ortopédicos ou cirurgia. Cerca de 10% dos pacientes recidivam após uma melhora inicial e entram num estado crônico (polineuropatia recidivante crônica). A patologia e os dados laboratoriais são similares aos casos agudos, mas a fraqueza pode ser mais assimétrica e progredir mais lentamente. Eventualmente, os nervos se tornam palpáveis devido a episódios repetitivos de desmielinização e remielinização segmentar. No estado crônico, corticosteróides melhoram a fraqueza, podendo ser necessário terapia prolongada. Agentes imunossupressores (azatioprina) e plasmaferese beneficiam alguns pacientes.

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